Maldosas
COMO TUDO COMEÇOU
Imagine que estamos alguns anos atrás, no verão, entre o
sétimo e o oitavo ano. Você está
bronzeada de tanto tomar sol à beira da piscina, está usando
seu suéter da Juicy (lembra de
quando todo mundo tinha um?) e pensando em seu pretê, o
garoto que estuda naquela escola
cujo nome nós não mencionamos e que trabalha na Abercrombie
do shopping.Você está
comendo seu cereal matinal favorito, Cocoa Krispies, do
jeitinho que mais gosta — mergulhado
no leite desnatado — e vê a cara dessa garota na lateral da
caixa de leite. DESAPARECIDA.
Ela é bonitinha — provavelmente mais que você — e tem um ar
briguento. Daí você pensa
"Hum, talvez ela também goste de Cocoa Krispies
empapado". E pode apostar que ela também
acha o menino da Abercrombie bem lindo.Você se pergunta como
alguém tão... hum, tão
parecida com você, desapareceu. Você achava que só as
meninas que participam de concursos
de beleza acabassem na lateral de caixas de leite.
Bem, pense melhor.
Aria Montgomery afundou seu rosto no gramado da casa de sua
amiga, Alison DiLaurentis.
— Delicioso — murmurou ela.
—Você está cheirando a grama? — perguntou Emily Fields, por
trás dela, batendo a
porta do Volvo de sua mãe para fechá-la, com um dos braços
longos e sardentos.
— É um cheiro bom. — Aria jogou o cabelo cheio de mechas
cor-de-rosa para trás e
respirou o ar morno do fim de tarde. — Cheiro de verão.
Emily deu tchauzinho para a mãe e ajeitou os jeans
horrorosos que usava pendurados
em seus quadris estreitos. Emily era da equipe de natação
desde a Liga Infantil e, apesar de ficar
incrível de maiô, jamais poderia vestir nada justo demais,
nem remotamente bonito, como as
outras meninas do sétimo ano. Isso porque os pais de Emily
insistiam que a beleza vinha de
dentro para fora (embora Emily tivesse certeza de que ser
obrigada a esconder uma camiseta
baby look que diz GAROTAS IRLANDESAS FAZEM TUDO MELHOR no
fundo de sua gaveta
de calcinhas não era algo que ajudasse alguém a construir o
caráter).
— Ei, meninas. —Alison deu uma pirueta no jardim. Naquela
tarde, seu cabelo estava
preso num rabo de cavalo desleixado e ela ainda usava sua
saia xadrez da festa de final de ano
da equipe enrolada na cintura para parecer mais curta.
Alison era a única menina do sétimo ano
que conseguira entrar para o time da escola. Pegava carona
para casa com as meninas mais
velhas do Colégio Rosewood Day que ouviam o rapper Jay-Z em suas Cherokees o
mais alto
possível e espirravam perfume nela antes que descesse do
carro para que ela não chegasse em
casa cheirando a cigarros, o que revelaria que todas haviam
fumado.
— O que eu estou perdendo? — perguntou Spencer Hastings,
aparecendo por um
buraco da cerca viva para se juntar às outras. Spencer
morava na casa ao lado. Ela jogou seu
longo cabelo num rabo de cavalo louro escuro e deu um gole
em sua garrafa esportiva roxa.
Spencer não havia ido para o time principal com Ali no
outono, então tinha que jogar com as
meninas do sétimo ano. Ela passara um ano se esforçando como
louca no campo de hóquei, para
aperfeiçoar suas manobras, e as meninas sabiam que ela havia
praticado dribles no quintal antes
de elas chegarem. Spencer odiava que alguém fosse melhor que
ela em qualquer coisa.
Especialmente se esse alguém fosse Alison.
— Esperem por mim!
Elas se viraram a tempo de ver Hanna Marin saindo da
Mercedes de sua mãe. Ela
tropeçou na própria mochila de livros e acenou toda animada
com seus braços gorduchos. Desde
que os pais de Hanna se divorciaram, no ano anterior, ela
vinha aumentando de peso
gradativamente, o que fazia com que suas roupas ficassem
cada vez menores. E, embora Ali tenha revirado os olhos nessa hora, o restante
das meninas fingiu que não percebeu. É isso que
as boas amigas fazem.
Alison, Aria, Spencer, Emily e Hanna haviam se conhecido no
ano anterior quando seus
pais as inscreveram para trabalhar aos sábados à tarde nos
projetos de caridade do Colégio
Rosewood Day — todas, menos Spencer, que foi trabalhar lá
porque quis. Mesmo que Alison
não soubesse nada sobre as outras quatro, todas elas a
conheciam. Ela era perfeita. Linda,
espirituosa, inteligente. Popular. Os meninos queriam beijar
Alison e as meninas — mesmo as
mais velhas — queriam ser ela. Então, na primeira vez em que Ali riu de uma das
brincadeiras
de Aria, fez uma pergunta sobre natação para Emily, disse a
Hanna que sua camiseta era
adorável ou comentou que a caligrafia de Spencer era muito
mais bonita que a dela, elas não
puderam evitar e ficaram, bem... deslumbradas. Antes de Ali,
as garotas se sentiam como as
calças jeans de cintura alta e pregas de suas mães —
estranhas e notadas pelas razões erradas.
Mas, depois, Ali fez com que se sentissem como as roupas
esportivas mais perfeitas do mundo,
feitas pela Stella McCartney — aquelas que são tão caras que
ninguém pode comprar.
Então, mais de um ano depois, no último dia do sétimo ano,
elas não eram apenas as
melhores amigas do mundo, eram as meninas do Rosewood Day.
Muita coisa acontecera para
que fosse assim. Todas as vezes em que dormiram nas casas
umas das outras, todas as viagens
para o campo tinham sido uma nova aventura.Até mesmo quando
se reuniam na sala de estudos
para, teoricamente, fazer o dever de casa, sempre acontecia
algo memorável (ler a carta melosa
do capitão do time do colégio para sua professora particular
de matemática no sistema de altofalantes da escola havia se tornado um
clássico). Mas havia outras coisas que todas elas queriam
esquecer. E havia um segredo em especial, sobre o qual elas
não queriam nem falar a respeito.
Ali dizia que eram os segredos que mantinham as cinco unidas
como melhores amigas por toda
a eternidade. E isso era verdade. Elas seriam amigas para
sempre.
— Estou tão feliz que este dia acabou — gemeu Alison, depois
de empurrar Spencer
com delicadeza de volta pelo buraco da cerca viva. — Vamos
para a sua casa de hóspedes.
— Estou tão feliz que o sétimo ano acabou — disse Aria, e
então ela, Emily e Hanna
seguiram Alison e Spencer até o galpão recém-reformado, onde
a irmã mais velha de Spencer,
Melissa, havia morado durante todo o ensino médio. Por
sorte, ela tinha acabado de se formar e
viajado para passar o verão em Praga, então o lugar era todo
delas naquela noite.
De repente, elas ouviram um guincho:
— Alison! Ei,Alison! Ei, Spencer! — Alison se virou para
olhar em direção à rua.
— Isso não — sussurrou ela.
— Isso não — Spencer, Emily e Aria repetiram.
Hanna fez cara feia.
— Droga.
"Isso não" era o jogo que Ali havia roubado do
irmão dela, Jason, veterano em
Rosewood Day.Jason e seus amigos jogavam nas festas da
escola, enquanto avaliavam as
garotas. Ser o último a dizer "isso não" queria
dizer que você ia ter que ficar a noite toda com a
menina mais feia, enquanto seus amigos ficavam com as
bonitas, e quem ficasse com a feiosa
era, na verdade, tão tonto e feio quanto ela. Na versão de
Ali, as meninas diziam "isso não" toda
vez que alguém feio, careta ou pobre chegasse perto delas.
Desta vez o "isso não" era para Mona Vanderwaal —
uma imbecil cujo passatempo era
tentar ficar amiga de Spencer e Alison — e suas duas amigas
esquisitas, Chassey Bledsoe e Phi
Templeton. Chassey era a garota que havia hackeado os
computadores da escola e depois
ensinado ao diretor como aumentar a segurança deles; e Phi
Templeton ia a todos os lugares
com um ioiô — não é preciso dizer mais nada. As três
encararam as garotas do meio da rua
quieta e suburbana. Mona estava montada em sua scooter,
Chassey estava em uma mountain
bike preta e Phi estava a pé — com seu ioiô, claro.
— Vocês aí, querem vir com a gente e assistir Fear Factor? —
perguntou Mona.
— Desculpe — Alison disse, com candura. — Estamos meio
ocupadas.
Chassey franziu a testa.
— Vocês não querem ver os caras comendo os besouros?
— Que nojo! — Spencer sussurrou para Aria, que então começou
a fingir que comia
piolhos invisíveis da cabeça de Hanna, como um macaco.— Ah
é, bem que a gente queria. — Alison tombou a cabeça. — Faz um tempo que a
gente vem planejando passar a noite juntas. Mas quem sabe da
próxima vez?
Mona olhou para a calçada:
— Tá, tudo bem.
— A gente se vê. — Alison deu meia-volta, revirando os
olhos, e as outras garotas
fizeram a mesma coisa.
Elas passaram pelo portão dos fundos da casa de Spencer. À
esquerda delas, estava o
quintal de Ali, onde os pais dela estavam construindo um
gazebo capaz de abrigar vinte pessoas
para aqueles seus piqueniques metidos a besta.
— Graças a Deus, os pedreiros não estão aqui. — Ali deu uma
olhada numa
empilhadeira amarela.
Emily mudou o tom de voz:
— Eles andaram dizendo gracinhas para você de novo?
— Calma aí, delegada — disse Alison. As outras deram
risadinhas. Algumas vezes, elas
a chamavam de Emily Delegada, porque ela virava um pitbull
para defender Ali. Emily
costumava achar graça naquilo também, mas ultimamente não
ria mais com elas.
O ex-celeiro estava logo à frente. Era pequeno e
aconchegante e tinha uma janela
grande, que dava para os grandes espaços livres da
propriedade, que possuía seu próprio
moinho. Em Rosewood, na Pensilvânia, um subúrbio pequeno que
fica a mais ou menos trinta
quilômetros da Filadélfia, é mais provável que se viva numa
casa de fazenda com vinte e cinco
quartos, com piscinas azulejadas em mosaico e hidromassagem
do que em uma casa pré-
fabricada. Rosewood cheirava a lilases, a feno, a neve
fresca e a lenha queimada no inverno. A
região estava cheia de pinheiros altos, quilômetros e mais
quilômetros de fazendas familiares
bem rústicas, e raposas e coelhos bem fofinhos. Havia um
shopping, propriedades em estilo
colonial e uma porção de áreas ao ar livre, perfeitas para
comemorar aniversários, formaturas e
para festas que gostamos de dar sem motivo algum. E os
meninos de Rosewood eram lindos e
chegavam a brilhar de tão saudáveis. Pareciam todos saídos
de um comercial de cuecas, de
perfume ou de um catálogo esportivo da Abercrombie. Aquela
era a nata da Filadélfia .Várias
famílias ricas e tradicionais, com dinheiro antigo e
escândalos mais antigos ainda.
Conforme as garotas se aproximavam da casa de hóspedes,
ouviram risinhos vindos de
lá.
Alguém guinchou:
— Eu já disse para você parar!
— Ah, meu Deus — Spencer gemeu. — O que é que ela está
fazendo aqui?
Quando espiou pelo buraco da fechadura, Spencer viu Melissa,
sua irmã mais velha, o
orgulho e a alegria de seus pais, a filha perfeita, no sofá
dando uns amassos em Ian
Thomas , seu
namorado gostosão. Spencer meteu o pé na porta e a forçou a
abrir. A casa de hóspedes cheirava
a musgo e a pipoca recém-estourada.
Melissa se virou.
— Que droga... — ela disse. Então, notou as outras e sorriu.
— Ah, oi, meninas.
As meninas deram uma olhada em Spencer. Ela sempre
reclamava que Melissa era uma
cobra venenosa, então, ficavam sempre alerta quando Melissa
parecia gentil e doce.
Ian se levantou, espreguiçou-se e deu um sorriso forçado
para Spencer.
— Ei — disse ele.
— Oi, Ian — Spencer respondeu numa voz muito mais alegre. —
Eu não sabia que você
estava aqui.
— Sim, você sabia — Ian sorriu, como se estivesse
paquerando. — Você estava nos
espionando.
Melissa arrumou seu cabelo loiro comprido e a faixa de seda
preta na cabeça, encarando
a irmã.
— E aí, quais as novidades? — perguntou ela, um pouco
acusadoramente.
— É só... eu não queria me intrometer... — Spencer cuspiu as
palavras. — Mas era para
nós ficarmos aqui essa noite.
Ian bateu no braço de Spencer, brincando com ela.
— Eu só estava implicando com você — provocou ele. Uma
mancha vermelha subiu pelo pescoço dela. Ian tinha cabelo loiro, que estava
sempre desarrumado, olhos cor de avelã, com um olhar
sonolento, e os músculos do abdome
realmente valiam um aperto.
— Uau — falou Ali, numa voz alta demais. Todas as cabeças se
voltaram para ela. —
Melissa, você e Ian formam um casal perfeito. Eu nunca
falei, mas sempre pensei isso.Você não
concorda, Spencer?
Spencer piscou.
— Hum — disse ela, baixinho.
Melissa encarou Ali por um segundo, confusa, e então se
virou para Ian.
— Posso falar com você lá fora?
Ian engoliu sua cerveja Corona, enquanto as meninas
assistiam. Eles bebiam
secretamente das garrafas dos armários de bebidas de seus
pais. Ele jogou fora a garrafa vazia e
deu a elas um sorriso irônico, enquanto seguia Melissa para
fora.
— Adieu, senhoras. — Ian deu uma piscada antes de fechar a
porta atrás dele.
Alison fez um gesto como que tirando pó das mãos.
— Outro problema resolvido por Ali D. Você vai me agradecer
agora, Spencer?
Spencer não respondeu. Ela estava muito ocupada olhando a
janela da frente do celeiro
Vaga-lumes começavam a iluminar O céu, que estava ficando
púrpura.
Hanna andou até a tigela de pipoca abandonada e pegou um
punhado grande.
— Ian é tão gostoso. Ele é até mais gostoso que o Sean. —
Sean Ackard era um dos
caras mais bonitos do ano delas, e tema das constantes
fantasias de Hanna.
— Você sabe o que eu ouvi? — perguntou Ali, se jogando
pesadamente no sofá. — Que
na verdade Sean gosta de garotas que têm um bom apetite.
Hanna se animou.
— Verdade?
— Não — Alison bufou.
Hanna jogou o punhado de pipoca de volta na tigela, bem
devagar.
— Então, garotas — falou Ali. — Eu sei de uma coisa perfeita
que nós podemos fazer.
— Eu espero que a gente não vá correr pelada de novo por aí.
— Emily deu risadinhas.
Elas tinham feito aquilo um mês antes — num frio de rachar —
e, embora Hanna tenha
se recusado a tirar a camiseta e a calcinha que tinha um dos
dias da semana bordado, o restante
delas havia atravessado correndo um árido milharal sem
absolutamente nenhuma peça de roupa.
— Você gostou bastante daquilo — murmurou Ali. O sorriso se
apagou dos lábios de
Emily. — Mas não, eu estava deixando isso para o último dia
de aula. Eu aprendi como
hipnotizar as pessoas.
— Hipnotizar — repetiu Spencer.
— A irmã do Matt me ensinou. — Ali olhou as fotos de Melissa
e Ian em porta-retratos
em cima da lareira. Seu namorado da semana, Matt, tinha o
mesmo cabelo cor de areia de Ian.
— Como se faz? — perguntou Hanna.
— Desculpe, mas ela me fez jurar guardar segredo. — Ali se
virou para ficar de frente
para as meninas. —Vocês querem ver se funciona?
Aria franziu a testa, pegando um lugar numa almofada cor de
lavanda que estava no
chão.
— Eu não sei...
— Por que não? — Os olhos de Ali passaram rapidamente por um
porquinho de pelúcia
que pendia da bolsona de tricô púrpura de Aria. Ela estava
sempre carregando coisas estranhas
para todo o lado: animais de pelúcia, páginas sem sentido
arrancadas de velhos romances,
cartões-postais de lugares que ela nunca tinha visitado.
— A hipnose não faz você dizer coisas que não quer? —
perguntou Aria.
— Existe alguma coisa que você não queira contar para a
gente? — retrucou Ali. — E
por que você ainda traz esse porquinho para tudo quanto é
lugar? — Ela apontou para o
bichinho.
Aria sacudiu os ombros e puxou o porquinho de pelúcia para
fora da bolsa.
— Meu pai comprou Pigtunia na Alemanha para mim. Ela me dá
conselhos sobre a
minha vida amorosa. — Aria enfiou a mão dentro do boneco.—
Você está enfiando sua mão pelo traseiro dele — Ali gritou e Emily começou a
dar
risadinhas. — Além disso, por que você quer carregar por aí
algo que o seu pai lhe deu?
— Não é engraçado.—Aria virou a cabeça rapidamente para
encarar Emily.
Todas ficaram quietas por alguns segundos, e as meninas se
encararam sem expressar
nenhuma reação. Isso vinha acontecendo muito nos últimos
tempos: alguém — normalmente
Ali —mencionava algo, e outra pessoa ficava triste, mas
todas eram tímidas demais para
perguntar o que raios estava acontecendo.
Spencer quebrou o silêncio.
— Ser hipnotizado? Hum... soa engraçado.
— Você não sabe nada sobre isso — Alison foi logo dizendo.
—Vamos lá, eu poderia
fazer com vocês todas de uma vez.
Spencer puxou o cós da saia. Emily soprou o ar através dos
dentes.Aria e Hanna
trocaram um olhar.Ali sempre vinha com uma novidade — no
verão anterior, foi fumar
sementes de dentes-de-leão para ver se eram alucinógenas, e,
no último outono, tinham ido
nadar no lago Pecks, apesar de terem achado um corpo lá uma
vez — mas a verdade era que
elas, muitas vezes, não queriam fazer as coisas a que Alison
as obrigava. To das amavam Ali,
mas algumas vezes também tinham ódio dela — por controlá-las
de todas as formas em nome
do feitiço que tinha espalhado sobre elas. Às vezes, na presença
de Ali, não se sentiam
exatamente verdadeiras. Elas meio que se sentiam como
bonecas, com Ali controlando cada
movimento que faziam. Cada uma delas já desejara, pelo menos
uma vez, ter coragem de dizer
não a Ali.
— Por favoooooooooooooor? — perguntou Ali, irritada. —
Emily, você quer fazer isso,
certo?
— Hum... — a voz de Emily tremeu. — Bem...
— Eu farei — intrometeu-se Hanna.
— Eu também — disse Emily, rapidamente.
Spencer e Aria concordaram com a cabeça, de má vontade.
Satisfeita, Alison apagou
todas as luzes, com um movimento, e acendeu várias velas com
perfume de baunilha, na
mesinha de centro. Então, se afastou das meninas e
sussurrou.
— Certo, pessoal, apenas relaxem — ela cantarolou, e as
meninas se arrumaram num
círculo sobre o tapete. — Seus batimentos cardíacos estão
mais lentos. Tenham pensamentos
calmos. Eu vou contar de trás para a frente a partir de cem
e, assim que eu tocar cada uma,
vocês estarão sob meu poder.
— Assustador — riu Emily, se sacudindo.
Alison começou.
— Cem... noventa e nove... noventa e oito...
Vinte e dois...
Onze..
Cinco..
Quatro..
Três...
Ela tocou a testa de Aria com a parte mais carnuda do
polegar. Spencer descruzou as
pernas. Aria moveu o pé esquerdo.
— Dois... — Ela tocou Hanna vagarosamente, depois Emily, e
então caminhou em
direção a Spencer. — Um.
Os olhos de Spencer se abriram de repente, antes que Alison
pudesse alcançá-la. Ela
ficou em pé, num pulo, e correu para a janela.
— O que está fazendo? — sussurrou Ali. —Você está estragando
o clima.
— Está muito escuro aqui. — Spencer alcançou a janela e
abriu as cortinas.
— Não. —Alison relaxou os ombros. —Tem que estar escuro, é
assim que funciona.
— Ah, vamos lá, não é assim. — A cortina prendeu e Spencer
deu um gemido junto
com o puxão para soltá-la.
— Não. É assim.
Spencer colocou as mãos nos quadris.
— Eu quero que fique mais claro. Talvez todo mundo queira.
Alison olhou para as outras. Elas ainda tinham os olhos fechados.
Spencer não ia desistir.
— Não tem sempre que ser como você quer, sabe, Ali?
Alison soltou uma risada aguda.
— Feche as cortinas!
Spencer revirou os olhos.
— Por Deus, tome um calmante.
— Você acha que eu deveria tomar um calmante? — perguntou
Alison.
Spencer e Alison se encararam por alguns momentos. Era uma
daquelas brigas ridículas
que podia ser sobre quem viu primeiro o novo vestido polo da
Lacoste na Neiman Marcus, ou se
as luzes cor de mel no cabelo de alguma menina eram ousadas
demais, mas, na verdade, a briga
tinha a ver mesmo com outra coisa. Algo muito maior.
Finalmente, Spencer apontou para a porta.
— Saia.
— Está bem. — Alison caminhou para fora.
— Que bom! — Mas, depois de alguns segundos, Spencer foi
atrás dela. O ar da noite
azulada estava parado, e ainda não havia nenhuma luz acesa
na casa principal. Tudo estava
quieto demais, até mesmo os grilos estavam calados, e
Spencer podia ouvir a própria respiração.
— Espere um segundo! — gritou ela, depois de um momento,
batendo a porta atrás
dela. — Alison!
Mas Alison havia partido.
Quando ouviu a porta bater, Aria abriu os olhos.
— Ali? — chamou ela. — Meninas? — não houve reposta.
Aria olhou ao redor. Hanna e Emily estavam jogadas no
carpete, e a porta estava aberta.
Aria foi até a varanda. Não havia ninguém lá. Ela andou na
ponta dos pés até os limites da propriedade de Ali. Os bosques se espalhavam à
frente, e tudo estava silencioso.
— Ali? — murmurou. Nada. — Spencer?
Do lado de dentro, Hanna e Emily esfregavam os olhos.
— Eu tive o sonho mais estranho da minha vida — declarou
Emily. — Quer dizer, acho
que foi um sonho. Foi muito rápido. Alison caiu num poço
muito fundo, e tinha umas plantas
gigantes.
— Eu também tive esse sonho! — disse Hanna.
— Sério? — perguntou Emily.
Hanna fez que sim com a cabeça.
— Bem, mais ou menos. Havia uma planta gigante nele. E acho
que vi Alison também.
Podia ser sua sombra... mas, definitivamente, era ela.
— Uau! — sussurrou Emily. Elas se encararam com os olhos
arregalados.
— Meninas? — Aria voltara. Estava muito pálida.
—Você está bem? — quis saber Emily.
— Onde está Alison? — Aria franziu a testa. — E Spencer?
— Não sabemos — respondeu Hanna.
Bem nesse momento, Spencer abriu a porta com violência e
entrou de volta na casa.
Todas as meninas deram um pulo.
— O que foi? — perguntou ela.
— Onde está Ali? — sussurrou Hanna.
— Eu não sei. — Spencer murmurou de volta. — Pensei... Eu
não sei.
As meninas ficaram em silêncio. Tudo o
que podiam ouvir eram os galhos das árvores
se movendo além das janelas. Parecia o som de alguém
raspando unhas longas contra um prato.
— Acho que quero ir para casa — falou Emily.
Na manhã seguinte, elas não tinham nenhuma notícia de
Alison. As garotas se telefonaram para
conversar, uma conversa a quatro desta vez, em vez de
cinco.— Você acha que ela está brava com a gente? — perguntou Hanna. — Ela
estava
estranha a noite toda.
— Provavelmente está na casa da Katy — cogitou Spencer. Katy
era uma das amigas
de Ali, do time de hóquei sobre a grama.
— Ou talvez ela esteja com Tiffany... aquela garota do
acampamento — propôs Aria.
— Eu tenho certeza de que ela está em algum lugar se
divertindo — disse Emily,
calmamente.
Uma a uma, as meninas receberam ligações da sra.
DiLaurentis, perguntando se tinham
notícias de Ali. No começo, todas as meninas deram cobertura
a ela. Era uma regra delas:
tinham dado cobertura a Emily quando ela perdeu a hora num
fim de semana e não voltou para
casa às onze da noite; tinham acobertado Spencer quando ela
pegou emprestado o casaco Ralph
Lauren da Melissa e depois o esqueceu, acidentalmente, no
banco do trem; e assim por diante.
Mas quando cada uma desligava depois de falar com a sra.
DiLaurentis, um sentimento amargo
crescia em seu estômago. Alguma coisa parecia terrivelmente
errada.
Naquela tarde, a sra. DiLaurentis ligou novamente, desta vez
em pânico. À noite, os
DiLaurentis chamaram a polícia, e na manhã seguinte, havia
carros de polícia e vans das
equipes da imprensa acampados no normalmente imaculado
jardim dos DiLaurentis. Era o
sonho de qualquer noticiário local: uma garota rica e
bonita, perdida numa das cidades de classe
alta mais seguras do país.
Hanna telefonou para Emily, depois de assistir às primeiras
notícias sobre Ali.
— A polícia entrevistou você hoje?
— Sim — sussurrou Emily.
— Eu também dei entrevista.Você não falou a eles sobre...—
Ela fez uma pausa. —
Sobre A Parada da Jenna, falou?
— Não! — ofegou Emily. — Por quê? Você acha que eles sabem
de alguma coisa?
— Eu... eles não poderiam! — sussurrou Hanna, depois de um
segundo. — Nós somos
as únicas que sabemos. Nós quatro e... Alison.
A polícia interrogou as meninas, assim como praticamente
todo mundo de Rosewood,
do instrutor de ginástica de Ali no segundo ano ao cara que
uma vez vendeu Marlboros a ela no
Wawa. Era o verão antes do oitavo ano, e as meninas deveriam
estar paquerando garotos mais
velhos em festas à beira da piscina, comendo espiga de milho
nos quintais umas das outras e fazendo compras o dia inteiro no Shopping Center
King James. Em vez disso, estavam chorando
sozinhas em suas camas de dossel, ou olhando para o nada,
encarando as paredes cobertas de
fotos. Spencer entrou numa de arrumar o quarto, revendo
sobre o que realmente havia sido sua
briga com Ali e pensando no que poderia saber a respeito
dela que nenhuma das outras sabia.
Hanna passou horas no chão do quarto, escondendo pacotes de
Cheetos vazios embaixo do
colchão. Emily não conseguia parar de pensar numa carta que
havia mandado a Ali antes de ela
desaparecer. Será que Ali recebeu? Aria sentou-se em sua
escrivaninha com Pigtunia.
Lentamente, as meninas começaram a telefonar umas para as
outras com menos frequência. O
mesmo pensamento assombrava as quatro, mas não havia nada
mais a ser dito entre elas.
O verão acabou, e veio outro ano escolar, que foi seguido
pelo começo de outro verão.
E nada de Ali. A polícia continuou com as buscas, mas sem
alarde. A mídia perdeu o interesse e
se voltou para a obsessão que rondava um triplo homicídio
ocorrido no centro da cidade. Até
mesmo os DiLaurentis se mudaram de Rosewood, mais ou menos
dois anos e meio depois que
Alison desapareceu. No que diz respeito a Spencer, Aria,
Emily e Hanna, algo nelas também
mudou. Agora, se elas passavam pela velha rua de Ali e davam
uma olhada para a casa dela, não
entravam mais no modo "choro instantâneo". Em vez
disso, começaram a sentir algo mais.
Alívio.
Claro, Alison era Alison. Ela era o ombro onde chorar as
mágoas, a única que você
gostaria de ver ligando para o seu pretê para saber como ele
se sentia sobre você, assim como
também era dela a palavra final sobre se o seu novo jeans
fazia sua bunda parecer maior. Mas as
meninas também tinham medo dela. Ali sabia mais sobre elas
do que qualquer outra pessoa, incluindo as coisas ruins que queriam enterrar —
como um corpo. Era horrível pensar que Ali
podia estar morta, mas... se estava, pelo menos seus
segredos estariam seguros.
E estavam. Pelo menos, por três anos.